aliás, vale a pena pensar nisto

é preciso ter a luz certa para uma fotografia ficar perfeita. escrever era assim, escrevia-se quando estava sol, o alpendre fresco, o ribeiro a cantar, os pássaros conversando sobre os grilos da noite e as flores da tarde. escrevia-se sobre o sentimento mais simples da vida - o amor. naquele tempo escrevia-se sobre o que não se podia ver nem ouvir à luz do sol. suspirava-se entre cada palavra, depositava-se na tinta e no papel a esperança de um sorriso, de um final feliz. quem sabe ver o mar ao amanhecer, quem sabe o campo ao entardecer, e mais tarde, as estrelas na manta azul que a avó tempo teceu. o amor foi passando de moda. como um trapo colorido que ao sol foi perdendo a sua cor intensa. agora é só um pano deslavado e sem cor definida. um nem peixe nem carne. sentir por sentir. fingir não sofrer. os bilhetes de amor e as mãos dadas às escondidas fazem falta. o alpendre nunca mais foi o mesmo sem as cartas de amor. a ribeira canta mais baixinho, os pássaros? esses falam do tempo para o fazer passar.

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