Poema melancólico a não sei que mulher (Miguel Torga, Diário VII) - Cruzei-me novamente com o Miguel na prateleira de uma livraria ali no Chiado, uma daquelas que ninguém entra e que tem todos os livros espalhados, como deve ser... quando li, apaixonei-me.


Dei-te os dias, as horas e os minutos 
Destes anos de vida que passaram; 
Nos meus versos ficaram 
Imagens que são máscaras anónimas 
Do teu rosto proibido; 
A fome insatisfeita que senti 
Era de ti, 
Fome do instinto que não foi ouvido. 

Agora retrocedo, leio os versos, 
Conto as desilusões no rol do coração, 
Recordo o pesadelo dos desejos, 
Olho o deserto humano desolado, 
E pergunto porquê, por que razão 
Nas dunas do teu peito o vento passa 
Sem tropeçar na graça 
Do mais leve sinal da minha mão... 

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