wild horses

Parece que a minha escrita tem aquela distorção que as rádios têm quando não as apanhamos bem. Não me consigo ouvir. Não consigo sequer escrever com uma letra legível. Não oiço nada nem ninguém. Orelhas e coração moucos. Pudesse eu devorar um dicionário e então haveria descrições concretas para este estado. Talvez seja da chuva, da roupa, das unhas que não param de crescer por mais que passe a vida a cortá-las e a pintá-las com as cores mais berrantes. Talvez seja o cabelo:
"Ouça, homem com mania que é cabeleireiro, eu perdoo-lhe a falta de jeito para a profissão que escolheu, que escolheu ou que lhe aconteceu - eu também tenho jeito para os telefones, pelo menos há dias... - perdoo-lhe este corte de cabelo desgrenhado que me dá o ar constante de ter acabado de acordar, perdoo-lhe o facto de não me ter cortado a franja como lhe pedi e de ter destruído a minha auto-estima em 20min. Perdoo-lhe o facto de me ter feito pagar no final... Perdoo-lhe o facto de ter ido para casa sabendo que eu fiquei com este corte de cabelo psicadélico-epiléptico-maluco-de-esquilo-raivoso."
Sabe porquê?
Não me importo nem um bocadinho.

Enquanto escrevia...

Cirurgia plástica -70%
Será um sinal? Será que se pode operar a parte de nós que dá erros ortográficos e ao mesmo tempo melhorar o angulo dos nossos seios?

Nota:

Se vieste aqui parar por causa da palavra seio/os... és um tarado/a.

Lista fútil do mês de Outubro

Praia. Tróia e as suas conchas de mil cores, vamos até lá fotografar os meus seios expostos e deixar cair queixos, abrir bocas, soltar línguas e desejos.

As coisas que deixaste para trás...

Carta esquecida dentro de um livro de Anton Tchecov:

O fim das coisas é triste. É a sensação de termos vivido em vão, é a necessidade de esquecer, apagar o que foi aprendido pelas emocões, é a vontade de seguir em frente - vivo.
Queremos fingir que nada existiu e que errámos, as nossas escolhas foram más, escolhemos mal, a culpa é nossa... culpa - mea culpa.
No entanto essa foi a escolha acertada a dada altura da nossa vida, foi o amor e a felicidade durante algum tempo, portanto, errar é relativo e sobrevalorizado.
Há pessoas, lugares e momentos que não deveriam ser apagados ou esquecidos. As pessoas não são erros. O fim das coisas é triste. O fim do amor. O fim de qualquer coisa. O fim de uma vida.
O fim é por si só o esquecimento por excelência. Uma morte sem haver morte. É um sopro. Um conto de alguém que já não somos.
O fim é uma coisa triste, como a caneta que acaba. A caneta que usámos para criar pontes com o mundo.
Eu queria recordar todos os antes dos meus fins. Quando o verde era fresco e o azul brilhante, os sorrisos cheios de vida, quando os bons momentos eram realmente bons.
Quem sabe escrever sobre as coisas realmente importantes?
Não receio a solidão, ela acontece quando nos abandonamos a nós mesmos, quando desistimos do que somos, quando já não acreditamos no valor dos pequenos gestos, quando não vemos as coisas mais pequenas - tu vês-me, eu vejo-te.
Acredito que quando for grande irei escrever sobre essas coisas importantes. Alguém tem que falar sobre elas ou irão ficar esquecidas para sempre como as músicas populares. Alguém tem de registar todas as coisas antes de elas chegarem ao fim.
Esperavas-me às cinco todos os dias... desculpa ter-te deixado. Queria ter uma recordação daqueles momentos juntas. Os chás. As tardes de sol. Nem uma fotografia. Nada. Uma morte sem haver morte é o que nos separa.
Isso e as coisas que deixaste para trás.

Quem disse que os textos sobre as pessoas que conhecemos deviam ser bonitos?

A pensar.
Com fome... vou jantar.

the girl from back then

O sono fugiu-me. Foi-se pela janela. Eu queria apenas que ele me embalasse até adormecer, depois podia ir por aí, noite adentro sem deixar rasto, eu não faria perguntas, juro, não perguntava onde tinha ido, amanhã de manhã quando acordasse com as marcas da almofada na bochecha.
Aqui fiquei eu sozinha, o cigarro a queimar lento entre os dedos e a caneta a escrever na mão. E eu deixo, não há nada que possa fazer, ela tem coisas para dizer, tem ciúmes do sono eu acho. Tem saudades de ler livros, saudades dessa rapariga que eu fui outrora, essa tal que andava de baloiço e tinha amigos interessantes que tocavam guitarra em bares obscuros e se embebedavam. Essa rapariga ria-se com facilidade, não tinha medo da vida e o tempo era ainda um homem gentil para ela. Hoje em dia essa rapariga engole as lágrimas em vez de vinho branco, escreve sobre os medos e fala pouco sobre as fantasias do amor e da cama, tem medo da caneta, daquilo que ela pode dizer, daquilo que ela pode despir.
Esta rapariga tem medo da nudez, não vá acabar a noite com os seios de fora.
Esta rapariga é um medo.
Há uma praia na minha memória da qual tenho saudades, essa rapariga visitava-a para ir encontrar-se com amigos secretos. Nessa praia havia mensagens antigas, corpos antigos, desejos quebrados e sonhos velhos, nela tudo era possível, todas as conversas conversáveis, todos os sexos viáveis. Não havia homem ou mulher, éramos uma só areia, uma só água que se misturava e criava castelos, sei que essa praia existe algures, cheia desses pescadores que nos embalam na sua corda e nos levam nos seus baldes de encanto para nos cozinharem depois nas suas mãos de amor - ela existe. O caminho até ela foi esquecido na teia de caminhos que a vida vai tecendo. A vida como as histórias, é orgânica está sempre a mudar, a cair, a criar... Nessa praia há rapazes de outros tempos a correr descalços, rapazes que vêem o pôr do sol e apanham conchas pela primeira vez, há raparigas que namoram sereias e sereias que nascem das estrelas. Nessa praia há uma rapariga que ainda está viva e que tem sonhos vivos, sonhos à espera.