Carta esquecida dentro de um livro de Anton Tchecov (2001)
O fim das coisas é triste. É a sensação de termos vivido em vão, é a necessidade de esquecer, apagar o que foi aprendido pelas emoções, é a vontade de seguir em frente - vivo.
Queremos fingir que nada existiu e que errámos, as nossas escolhas foram más, escolhemos mal, a culpa é nossa... culpa - mea culpa.
No entanto essa foi a escolha acertada a dada altura da nossa vida, foi o amor e a felicidade durante algum tempo, portanto, errar é relativo e sobrevalorizado.
Há pessoas, lugares e momentos que não deveriam ser apagados ou esquecidos. As pessoas não são erros. O fim das coisas é triste. O fim do amor. O fim de qualquer coisa. O fim de uma vida.
O fim é por si só o esquecimento por excelência. Uma morte sem haver morte. É um sopro. Um conto de alguém que já não somos.
O fim é uma coisa triste, como a caneta que acaba. A caneta que usámos para criar pontes com o mundo.
Eu queria recordar todos os antes dos meus fins. Quando o verde era fresco e o azul brilhante, os sorrisos cheios de vida, quando os bons momentos eram realmente bons.
Quem sabe escrever sobre as coisas realmente importantes?
Não receio a solidão, ela acontece quando nos abandonamos a nós mesmos, quando desistimos do que somos, quando já não acreditamos no valor dos pequenos gestos, quando não vemos as coisas mais pequenas - tu vês-me, eu vejo-te.
Acredito que quando for grande irei escrever sobre essas coisas importantes. Alguém tem que falar sobre elas ou irão ficar esquecidas para sempre como as músicas populares. Alguém tem de registar todas as coisas antes de elas chegarem ao fim.
Esperavas-me às cinco todos os dias... desculpa ter-te deixado. Queria ter uma recordação daqueles momentos juntas. Os chás. As tardes de sol. Nem uma fotografia. Nada. Uma morte sem haver morte é o que nos separa.
Isso e as coisas que deixaste para trás.
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