Luz

Se esgravatar a memória consigo perceber onde se esconderam as pessoas que nela vivem disfarçadas de história. Quando nos afazeres do dia-a-dia me encontro em pausa entre uma tarefa e outra, há momentos em que eles aparecem para dizer "Boa tarde", como se nos cruzássemos na avenida ou no choupo.
Estão de passagem. Uns vão com as mãos atrás das costas. Alguns são apenas formas, outros cores - todos têm sons diferentes. Há os que são apenas sombras vindos de becos que não sei se existiram, berguilhas entreabertas entre grunhidos escuros.
Gosto quando reencontro a Maria da Luz, a Céu, a Carina... O Carlos.

Algo separou as nossas vidas, mas fomos paridos pela mesma terra. Há uma parte de mim que urge escrever sobre esta gente que mora dentro da minha alma como gémeo siamês - mas há este receio de os perder se se souber que naquele chão houve tanta sujidade.
Chegará o momento certo.
Haverá um dia luz que nos ilumine a todos, um dia.

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