A cova onde iam enterrar o meu pai
Não sei como, nem porque começaram estes sonhos vividos e cheios de detalhes.
Um dia chuvoso, a igreja da minha infância, um funeral. Um padre atrasado e uma sepultura que precisava ser aberta para enterrar um morto. Esse morto era o meu pai. Eu, de pá na mão, abria a cova com vitalidade, numa espécie de transe, tirando a terra em silêncio sob o olhar assombrado das pessoas à volta que iam e vinham ver o espetáculo da filha que enterra o próprio pai. Enquanto olho a terra que sai do buraco, estou consciente da falta de emoção, penso que deveria sentir alguma coisa, chorar - mas não sinto nada. Não estou sequer triste, estou concentrada apenas em abrir aquele buraco onde o meu pai vai ser esquecido. A pá bate em algo. É quando a pá bate que subitamente me vejo de fora, de pá na mão, é nesse momento que as emoções me devoram e grito fechando os olhos: que não sou capaz, que a minha mãe ainda está dentro daquele buraco, que não sou capaz de continuar a cavar e encontrar o seu caixão com ela la dentro. Alguém sussurra que aquilo não é a minha mãe, é um caixão vazio. Olho novamente, e diante de mim está uma caixa funda em madeira, tosca. Lá dentro, uns panos floridos dobrados à muitos anos. Parecem vestidos e roupas no fundo de um baú. Um homem vem e tira um xaile em seda bordado, mostramo. Digo em voz alta: sempre quis ter um xaile desses. Vou embrulhar o teu pai. E afasta-se olhando de forma reprovadora, aquela filha que cobiçou os trapos onde iriam envolver o seu pai morto.
Um dia chuvoso, a igreja da minha infância, um funeral. Um padre atrasado e uma sepultura que precisava ser aberta para enterrar um morto. Esse morto era o meu pai. Eu, de pá na mão, abria a cova com vitalidade, numa espécie de transe, tirando a terra em silêncio sob o olhar assombrado das pessoas à volta que iam e vinham ver o espetáculo da filha que enterra o próprio pai. Enquanto olho a terra que sai do buraco, estou consciente da falta de emoção, penso que deveria sentir alguma coisa, chorar - mas não sinto nada. Não estou sequer triste, estou concentrada apenas em abrir aquele buraco onde o meu pai vai ser esquecido. A pá bate em algo. É quando a pá bate que subitamente me vejo de fora, de pá na mão, é nesse momento que as emoções me devoram e grito fechando os olhos: que não sou capaz, que a minha mãe ainda está dentro daquele buraco, que não sou capaz de continuar a cavar e encontrar o seu caixão com ela la dentro. Alguém sussurra que aquilo não é a minha mãe, é um caixão vazio. Olho novamente, e diante de mim está uma caixa funda em madeira, tosca. Lá dentro, uns panos floridos dobrados à muitos anos. Parecem vestidos e roupas no fundo de um baú. Um homem vem e tira um xaile em seda bordado, mostramo. Digo em voz alta: sempre quis ter um xaile desses. Vou embrulhar o teu pai. E afasta-se olhando de forma reprovadora, aquela filha que cobiçou os trapos onde iriam envolver o seu pai morto.
Notas
Podia ficar anos sem ouvir a tua voz e saberia no meio da multidão encontrar-te. São esses pequenos detalhes, quando me deparo com eles, que me deixam desarmada. Ainda com esperança de curar o mal do amor, essa chaga pulsante que vive dentro do peito.
La notte
Miss Resy - I'd like a novel about a woman who loves a man... but the man doesn't love her. But he admires her intelligence, her character. They live together... But how could the story end?
Giovanni - In so many ways.
Miss Resy - She'd had to be a strong woman, who can sacrifice herself. She sacrifices herself for another woman's happiness.
Giovanni - Why does she sacrifices herself?
Miss Resy - I don't know, it makes me want to cry.
Giovanni - In so many ways.
Miss Resy - She'd had to be a strong woman, who can sacrifice herself. She sacrifices herself for another woman's happiness.
Giovanni - Why does she sacrifices herself?
Miss Resy - I don't know, it makes me want to cry.
nada de muito importante
Quando se tenta pôr alguma ordem nas ideias, tudo fica ainda mais baralhado, nem sei porque se tenta. Por onde começar, quem tem a cabeça nas mãos? Será a casa do homem ou serão as pessoas despedaçadas pelo tempo? Ou eram as raízes?
Quando estava a viajar de volta parecia-me tudo tão claro, as ideias em fila - cristalinas - como um lago onde se podem contar os seixos lá no fundo. Hoje já se voltou a baralhar tudo, e está novamente a água turva. As ideias entaramelam-se, as palavras enrolam-se nas linhas e nada sai direito.
Devia escrever todos os dias as coisas que penso, mas aquilo que escrevo sai ao contrário daquilo que penso, como se a Rute de dentro e a de fora fossem de países diferentes e a tradução estivesse toda errada. Voltarei?
Quando estava a viajar de volta parecia-me tudo tão claro, as ideias em fila - cristalinas - como um lago onde se podem contar os seixos lá no fundo. Hoje já se voltou a baralhar tudo, e está novamente a água turva. As ideias entaramelam-se, as palavras enrolam-se nas linhas e nada sai direito.
Devia escrever todos os dias as coisas que penso, mas aquilo que escrevo sai ao contrário daquilo que penso, como se a Rute de dentro e a de fora fossem de países diferentes e a tradução estivesse toda errada. Voltarei?
Este branco em todo o lado
Sei que a parte de mim que esquece estilhaça dentro da que jamais esquecerá. Tento esquecer e não consigo. (in Al Berto, Diários)
Ao menos as tuas palavras, Al Berto, para secarem esta sede de não dizer nada havendo tanto não dito.
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