loucura de uma tarde de Verão

Eu quero fazer chapéus.
Quero remar contra a maré e encontrar-me contigo na Foz do Douro pela primeira vez em 1000 anos. Não vamos pensar em sexo desta vez, vamos só dar as mãos e ver o nascer do sol que está mesmo atrás de ti. Nunca o vês.
Quero correr na linha do eléctrico, beijar aquela luz de cidade entristecida.
A minha cidade. Porto.
Preciso dessas futilidades para aguentar... ah os dias, os dias longos e frios, brancos como o fluorescente das lâmpadas do mercado. Dá-me, dá-me lagartixas a correr, eu preciso, preciso das ruas inclinadas, do movimento do autocarro, da chuva a escorrer nos vidros, daqueles cafés com cadeiras de madeira. Que se fodam as de plástico.
Coisas pequeninas...
Pequenas... as cordas de um violoncelo... aulas de música... não cresço, criança, adolescente, rebelde. Quero o meu pai de volta para poder ser do contra. Contra o quê?
Contra mim, contra a parede e o vaso parte-se com as rumãs a rebolar... e rimos da loucura dos dias mortos de Verão que de nada ou pouco servem. Eu percebo... a luz influencia-me a escrever. Os dedos moles, demoram a pensar, dobram-se em cima das letras... tesão, preciso.
Quero gritar, sussurrar dentro de mim, dentro da sala escura, vamos fechar as janelas.
Paris... Silêncio. Paris acordou.
Paris, a pradaria do imaginário literário. Ah o romance que fede decomposto...
O amor... pequeno capuchinho vermelho, eu como-te. Devoro a tua capa, e em pelo, tu pedes-me que te abrace... tens frio.

"conta-me uma história, estou tão aborrecida, vá lá" (e depois ninguém contou nada)

Alberto.
Este nome não me sai da cabeça desde o dia em que, percorrendo o meu usual caminho diário, não parava de o repetir vezes e vezes sem conta. Alberto. Alberto com o "l" bem enrolado na língua. Alberto com o "r" matreiro a querer correr como um carro barulhento. Alberto. Esguio, alto, magro e suave como uma folha verde e macia que se dobra com as carícias matreiras do vento, que as percorre sem pedir autorização. 
Quem será o Alberto? Terei eu um Alberto dentro de mim? Talvez ele seja músico... espera, espera... ele toca guitarra. Os dedos longos e finos como ramos de romã beliscam com suavidade as cordas arrepiadas e virgens, e os sons viajam no ar em aviões muito pequeninos e leves. São barquinhos de papel na imensidão marítima do tempo e espaço. Queria ter dedos assim, dedos conhecedores de notas musicais "Como está senhor Dó Menor? Dona Ré, à quanto tempo, mais verdinha hoje!".
Para mim o Ré é verde, se eu fosse "cinestésica" era verde mesmo.
Um dia ele convida-me para tomar café e eu nem vou acreditar quando ele tocar para mim na sua guitarra de algodão. O meu chapéu será azul com muitas nuvens penduradas, e no café desenho uma ovelha dourada. A música da Pantera Cor-de-Rosa será a nossa banda sonora ao entardecer...
Ai, ai... Alberrrrto!

divagação numa tarde de sol

dentro de mim há um deserto. estende-se até ao infinito. é azul, da cor do céu. é nele que mergulham as emoções como peixes cansados de voar. eu dispo-me nesse deserto e no instante em que a minha pele fica nua eu e ele somos um. não sei onde começo ou termino naquele deserto, se me deito, perco-me de mim e sou o infinito que existe nas coisas belas. também eu sou como um peixe sedento, quero saciar esta sede nessa areia. mais, mais que esta não chega... morro... eu morro-me se não beber desse mar azul.