Eu sei...

Agora me recordo de como era o mundo antigamente.

As noites longas, o rádio sempre a tocar qualquer coisa, mesmo quando tinha muito sono. A janela, entreaberta, deixava entrar o lusco-fusco do amanhecer, e eu lutava por manter os meus olhos bem abertos para ver o sol a acordar, mas nunca conseguia, ao primeiro raio já eu dormia.

Saudades desse sol que acordava com o miar dos gatos. Saudades da calçada e do velho autocarro amarelo que me levava a todo o lado, mesmo quando estava atrasado. Gostava dos cigarros clandestinos fumados debruçada na janela. A lua, cúmplice de todas as mentiras, espreitava do outro lado das nuvens.

Já não tenho desses cigarros, já não existem essas janelas da minha memória. Agora tenho o mar azul e a areia de búzios. Os barcos cansados que pousam asas no horizonte e as gaivotas que se recusam a parar de voar.

Há em mim um pequeno floco de gelo que não derrete. As montanhas, as suas gentes. Já não sei porque fiquei longe. Eu sei quem sou.

Sem comentários: