A cor daquela terra ficou-me no sangue. O meu corpo vive alimentado por ela. Somos da mesma matéria. Somos folhas da mesma raiz, e dentro de nós correm moléculas de um mesmo ser, muito antigo, que nos originou.
Se fechar os olhos e imaginar aquele lugar eu vejo um verde muito vivo e uma terra muito vermelha, cheia de cor e calor. Sorrisos rasgados e flores felizes, árvores livres, mulheres amadas por outras mulheres. Crianças que sabem correr de calções. Pés descalço sem medo das pedras. Pulmões cheios de ar puro.
Calor.
Calor de gente, de sol que nunca se põe ainda que haja imensas nuvens no céu.
Lágrimas gordas que não foram choradas mas que se transformaram em chuva que me lavaram os braços, o peito, as pernas e os pés. Chuva que me roubou os medos e os monstros do escuro. Lavaram todas as crianças assustadas que se refugiaram na minha imaginação de velha de vinte tal anos.
Chuva que me alimentou a esperança e o sonho, esse órgão vegetal tão frágil.
A cor daquela terra roubou-me os olhos para sempre. Agora tenho olhos de argila vermelha. Olhos vividos e doridos, cheios de calos e feridas profundas de quem mexe nas pedras, de quem as amacia.
A cor daquela terra tingiu a minha vida. E de braços abertos corro pelas ruas para a abraçar e amar como a uma mulher antiga que se entregou para sempre aos amantes do mundo.
Em mim nasceu uma pequena folha verde, no ramo mais seco que era o coração.
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