Photograms

(Photogram by Lourdes de Castro)




A SOMBRA SOU EU
A minha sombra sou eu,
ela não me segue,
eu estou na minha sombra
e não vou em mim.
Sombra de mim que recebo luz,
sombra atrelada ao que eu nasci,
distância imutável de minha sombra a mim,
toco-me e não me atinjo,
só sei dó que seria
se de minha sombra chegasse a mim.
Passa-se tudo em seguir-me
e finjo que sou eu que sigo,
finjo que sou eu que vou
e que não me persigo.
Faço por confundir a minha sombra comigo:
estou sempre às portas da vida,
sempre lá, sempre às portas de mim!



(Poem: Almada Negreiros, Photogram: Mark Magnan)
'Que minha solidão me sirva de companhia.
Que eu tenha a coragem de me enfrentar.
Que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.'

Clarice Lispector

Divagações

Tudo se resume à velha máxima: o amor.
Queremos que gostem de nós.
Mãe, gostas de mim? Pai, gostas de mim? Tu, gostas de mim?
Queremos fugir da solidão, ainda que tudo o que façamos para o conseguir seja uma mentira, uma fraude. No final continuamos sós, quando desligamos o computador à noite, olhamos à nossa volta e o quem temos, afinal? Ninguém, nada. Um computador, uma sala vazia, amigos numa cidade distante. Confunde-se a realidade com a ficção. Prefiro ler um bom livro onde, de certa forma, os meus sentimentos estão protegidos numa estante, sãos e salvos de qualquer sofrimento.

dreams

havia uma praia de outrora cheia de memórias antigas que vieram dar à costa. na areia branca jaziam garrafas de vidro translúcido muito polido, lá dentro havia cartas com sonhos de pessoas minhas conhecidas, umas de agora, outras que já não via há anos. no meio do areal estavam uns sofás brancos, velhos de serem dançados de um lado para o outro pelas ondas do mar revoltas, sento-me neles e encontro por todo lado coisas minhas que perdi há muitos anos. deito-me. uma mulher aparece e pergunta-me se estou à espera dele, eu não sei de quem ela está a falar, mas ela diz que ele não vem, que ele não se lembra de mim, que ele seguiu a sua vida em frente, e tenta vender-me uma carteira. subitamente essa mulher começa a falar-me numa língua que eu não conheço, e quando dou por mim estou na Índia.
é uma rua agitada cheia de lojas e todos me tentam vender coisas, estou confusa, pois não percebo aquela língua. entro num café, ou é um restaurante? não sei, está cheia de sofás também, e de pessoas que como eu ali foram parar, olho em volta e vejo um sofá vazio. deito-me nele. oiço murmuros, eles dizem que estou à espera dele, mas que ele não vai voltar por minha causa, todos sabem que eu estou ali por causa dele. fecho os olhos. oiço o mar novamente. quando abro os olhos ele está deitado ao meu lado no sofá. 'que estás aqui a fazer?', pergunto. ele não diz nada.
acordei.

MACHINA

"Até cortar os próprios defeitos pode ser perigoso. Nunca se sabe qual é o defeito que sustenta nosso edifício inteiro."

Clarice Lispector.

MACHINA

Ele olha para ela. Ela fuma outro cigarro, é o terceiro de seguida.
'conta-me, o que se passa?'
'estou a morrer'
'não digas disparates, o que é que tens? o que se passa contigo?'
'estou a morrer de tristeza.'
Ela fuma. Ele fica-se em silêncio sem saber o que dizer.

MACHINA

máquina 
(latim machina, -ae)

s. f.
1. Aparelho destinado a produzir movimentos ou a transformar determinada forma de energia.
2. Instrumento ou aparelho formado de peças móveis. = maquinismo, mecanismo
3. Infrm. Locomotora.
4. Infrm. Qualquer veículo, geralmente motorizado.
5. Artes gráf. Prelo.
6. Fig. Obra grandiosa e reveladora de génio.
7. Conjunto de meios, órgãos e serviços que constituem determinada estrutura ou organização.
8. Pessoa que só faz o que lhe dizem. = autómato, robô
9. Inform. Computador.
máquina de alta pressãoa que trabalha com mais de quatro atmosferas.
máquina de baixa pressãoa que trabalha com menos de três atmosferas.
máquina eléctrica!diz-se de qualquer máquina que produz ou aproveita a electricidade!.
máquina fotográficaaparelho munido de câmara escura que serve para tirar fotografias.
máquina infernalartefacto explosivo destinado a matar.
máquina pneumáticaa destinada a produzir o vácuo.

Os meus pés estão tão frios que podia julgar que estou morta.

Happy V.

Differentes
'Amour, allez-vouz en pour qu'on puisse mourir'*



Falla commigo, amor. Conta-me tudo.
assim dizia a tua linda carta
As saudades que soffres quem se aparta!
E como eu sou feliz, porque me illudo!

Custou-me que partisses. E, comtudo,
murmurei ao sabel-o: «Pois que parta.
Aborreceu-se? Tambem eu estou farta.
E, se mudar, então tambem eu mudo.»

Foste. O que escreves são banalidades.
E contas-me sem sombra de saudades:
«passeio... mato o tempo, assim... assim...»

Commigo quasi o mesmo se está dando ;
mas, em vez de ser eu que o vou matando,
o tempo é que me vae matando a mim.

(Virginia Victorino, Namorados, 3ª Edição, Lisboa 1921)
* O amor vai embora assim que podemos morrer

Amor
'Amour, allez-vouz en pour qu'on puisse mourir'*


O amor! o amor! Ninguém o definiu.
E' sempre o mesmo. Acaba onde começa.
Quem mais o sente menos o confessa.
E quem melhor o diz nunca o sentiu.

Conhece a todos mas ninguem o viu.
Se o procuramos foge-nos depressa.
Se o desprezamos, todo se interessa.
Só esta presente quando já fugiu.

E quanto mais se quer, menos se alcança.
E' homem feito sendo uma criança.
Ninguém o encontra e em toda a parte mora.

Mata a quem dele vive. E' sempre assim.
Só principia quando chega ao fim.
Morreu ha muito e nasce em cada hora.

(Namorados de Virginia Victorino, 3ª Edição, 1921)
 * O amor vai embora assim que podemos morrer

Pensando em parvoíces...

Irei algum dia ouvir o meu rugido de tigre?

Tarde de expedição na Livraria Galileu

Depois de alguns momentos encantada no meio de milhares de livros, acabei por encontrar um amoroso livro de poesia chamado Namorados. Tem poemas de amor, um amor bitter, triste, um pouco ao estilo Romeu e Julieta. O amor impossível. A poesia do amor não carnal. Data de 1921. Encantada com a minha descoberta! Mal posso esperar para voltar à Galileu para mais uma tarde de tesouros!

Tua Mónica

Mónica fumava, cigarro atrás de cigarro nos intervalos dos almoços da gentalha feliz. Fumava para não pensar mais naqueles rios que lhe banhavam os pés. Fumava os seus desamores de menina, os sonhos que perdera, as inimizades que criara por ser amarga como as uvas selvagens que nem para o vinho as querem por serem azedas. Enquanto fumava os seus cigarros, dava espaço a que as memórias invadissem o presente, deixava que o mosto se misturasse com o cheiro a garotos e torradas, e não pensava mais nas mesas por limpar e nos clientes por atender. Deixava-se ficar solta e gingona como no tempo em que corria ladeira acima para limpar os baldes da colheita.
Crescera a saltar de linha em linha, desviando-se dos comboios que fugiam daquela terra eremita em direcção ao Porto. Adormecia embalada pelo seu cantar moribundo, o seu apito angustiante quando ali chegavam, e acordava com o badalo, de uma quase alegria, quando dali partiam. Cresceu impregnada com aquele cheiro de comboio. Estava-lhe na roupa, no cabelo e na pele.
Na pequena casa onde vivia, com a sua mãe que era padeira, podia ver dois rios distintos - o Douro e o Tua no seu abraço de amor. Mónica cresceu dividida entre aquelas duas paixões -  o rio e os comboios que lhe prometiam uma viagem para um lugar melhor.
Cresceu como peixe dentro de água, como diziam as velhas da aldeia, tinha aqueles rios onde era livre, lavava neles os seus males e neles chorava muitas vezes em silêncio, abafando na sua correnteza de cabra montanhesa as lágrimas de menina sem pai. Foi ali que cresceu, naquelas casas, nascidas como juncos à beira rio, entre a terra e a água, e ela era assim também, água e terra. Cresceu habituada às lides do Douro, aos horários pouco pontuais dos seus comboios, mas para ela aquela paz pequenina chegava-lhe para aquecer o coração, tal como o pequeno forno da padaria chegava para fazer o pão para toda a gente. Para ela era assim, as coisas sentiam-se bem, era porque estavam bem. Quando cresceu apanhou o comboio, como muitos haviam feito antes dela. Arranjou um trabalho num café numa daquelas cidades estrangeiras onde não há rios nem comboios. E hoje, ainda que não o admita, fuma cigarros para espantar com o fumo as memórias velhas, para espantar com aquele fumo os comboios  que lhe venham falar de um rio que se abraçava a outro num abraço eterno de amor.

A Princesa e a Ervilha
(Idem aspas aspas)

Versão Brasileira
Adaptado do conto de Hans Christian Andersen
Tirei daqui: http://www.educacional.com.br/projetos/ef1a4/contosdefadas/princesaervilha.html

Era uma vez um príncipe que queria se casar com uma princesa, mas uma princesa de verdade, de sangue real meeeeesmo. Viajou pelo mundo inteiro, à procura da princesa dos seus sonhos, mas todas as que encontrava tinham algum defeito. Não é que faltassem princesas, não: havia de sobra, mas a dificuldade era saber se realmente eram de sangue real. E o príncipe retornou ao seu castelo, muito triste e desiludido, pois queria muito casar com uma princesa de verdade.
Uma noite desabou uma tempestade medonha. Chovia desalmadamente, com trovoadas, raios, relâmpagos. Um espetáculo tremendo!
De repente bateram à porta do castelo, e o rei em pessoa foi atender, pois os criados estavam ocupados enxugando as salas cujas janelas foram abertas pela tempestade.
Era uma moça, que dizia ser uma princesa. Mas estava encharcada de tal maneira, os cabelos escorrendo, as roupas grudadas ao corpo, os sapatos quase desmanchando... que era difícil acreditar que fosse realmente uma princesa real. A moça tanto afirmou que era uma princesa que a rainha pensou numa forma de provar se o que ela dizia era verdade. Ordenou que sua criada de confiança empilhasse vinte colchões no quarto de hóspedes e colocou sob eles uma ervilha. Aquela seria a cama da “princesa”. A moça estranhou a altura da cama, mas conseguiu, com a ajuda
de uma escada, se deitar. No dia seguinte, a rainha perguntou como ela havia dormido.
— Oh! Não consegui dormir — respondeu a moça,
— Havia algo duro na minha cama, e me deixou até manchas roxas no corpo!
O rei, a rainha e o príncipe se olharam com surpresa. A moça era realmente uma princesa! Só mesmo uma princesa verdadeira teria pele tão sensível para sentir um grão de ervilha sob vinte
colchões!!! O príncipe casou com a princesa, feliz da vida, e a ervilha foi enviada para um museu, e ainda deve estar por lá... Acredite se quiser, mas esta história realmente aconteceu!

A menina dos fósforos
(pesquisa / inspiração)

Versão brasileira
 Conto adaptado de Hans Christian Andersen
Fui buscar aqui: www.members.fortunecity.com/gafanhota/fosforos
  
Era véspera de Ano Novo. Fazia um frio intenso; já estava escurecendo e caía neve. Mas a despeito de todo o frio, e da neve, e da noite, que caía rapidamente, uma criança, uma menina, descalça e de cabeça descoberta, vagava pelas ruas. Levava no avental velhinho uma porção de pacotes de fósforos e tinha na mão uma caixinha: não conseguira vender uma só em todo o dia, e ninguém lhe dera esmola - nem um só vintém.
Assim, morta de fome e frio, ia se arrastando penosamente, vencida pelo cansaço e o desânimo - a estátua viva da miséria.
Os flocos de neve caíam pesados, sobre os lindos cachos louros que lhe emolduravam graciosamente o rosto; mas a menina nem dava por isso. Via, pelas janelas das casas, as luzes que brilhavam lá dentro.
Achou um canto, formado pela saliência de uma casa, e acocorou-se ali, com os pés encolhidos para abrigá-los ao calor do corpo; mas cada vez sentia mais frio. Não se animava a voltar para casa, porque não tinha vendido uma única caixinha de fósforos, e não ganhara um vintém; era certo que levaria algumas lambadas. Além disso, lá fazia tanto frio como na rua, pois só havia o abrigo do telhado, e por ele entrava uivando o vento, apesar dos trapos e das palhas que lhe tinham vedado as enormes frestas.
Tinha as maozinhas tão geladas... estavam duras de frio. Quem sabe se acendendo um daqueles fósforos pequeninos, sentiria algum calor? Se se animasse a tirar um ao menos da caixinha, e riscá-lo na parece para acendê-lo... Ritch!... Como estalou, e faiscou, antes de pegar fogo!
Deu uma chama quente, bem clara, e parecia mesmo uma vela, quando ela o abrigou com a mão. E era uma vela esquisita, aquela! Pareceu-lhe logo que estava sentada diante de uma grande estufa, de pés e maçanetas de bronze polido. Ardia nela um fogo magnífico, que espalhava suave calor. E a menininha ia estendendo os pés enregelados para aquecê-los e... crac! Apagou-se o clarão! Sumiu-se a estufa, tão quentinha, e ali ficou ela, no seu canto gelado, com um fósforo apagado na mão. Só via agora a parede escura e fria.
Riscou outro. Onde batia a sua luz, a parede tornava-se transparente como a gaze, e ela via tudo lá dentro da sala. Estava posta a mesa, e sobre a toalha alvíssima via-se, fumegando entre toda aquela porcelana tão fina, um belo pato assado, recheado de maçãs e ameixas. Mas o melhor de tudo foi que o pato saltou do prato e, com a faca ainda cravada nas costas, foi indo pelo soalho direto à menina que estava com tanta fome, e...
Mas - que foi aquilo? No mesmo instante acabou-se o fósforo, e ela tornou a ver somente a parede nua e fria, na noite escura. Riscou outro fósforo, e àquela luz resplandecente, viu-se sentada debaixo de uma linda árvore de Natal. Oh! Era muito maior, e mais ricamente decorada do que aquela que vira, naquele Natal, ao espiar pela porta de vidro da casa do negociante rico. Entre os galhos brilhavam milhares de velinhas; e estampas coloridas, como as que via nas vitrinas das lojas, olhavam para ela. A criança estendeu os braços, diante de tantos esplendores, e então, então... apagou-se o fósforo. Todas as luzinhas de natal foram subindo, subindo, mais alto, cada vez mais alto, e de repente ela viu que eram estrelas, que cintilavam no céu. Mas uma caiu lá de cima, deixando uma esteira de poeira luminosa no caminho.
- Morreu alguém - disse a criança.
Porque sua avó, a única pessoa que a amara no mundo, e que estava morta, lhe dizia sempre que quando uma estrela desce, é que uma alma subiu para o céu.
Agora ela acendeu outro fósforo; e desta vez foi a avó que lhe apareceu, a sua boa vovó, sorridente e luminosa, no esplendor da luz.
- Vovó! - gritou a pobre menina - Leva-me contigo... Já sei que quando o fósforo se apagar, tu vais desaparecer, como se sumiram a estufa quente, e o rico pato assado, e a linda árvore de Natal!
E a coitadinha pôs-se a riscar na parede todos os fósforos da caixa, para que a avó não se desvanecesse. E eles ardiam com tamanho brilho, que parecia dia, e nunca ela vira a vovó tão alta, nem tão bela! E ela tomou a neta nos braços, e voaram ambas, em um halo de luz e de alegria, mais alto, e mais alto, e mais longe... longe da terra, para um lugar lá em cima onde não há mais frio, nem fome, nem sede, nem dor, nem medo, porque elas estavam agora com Deus.
A luz fria da madrugada achou a menina sentada no canto, entre as casas, com as faces coradas e um sorriso de beatitude. Morta. Morta de frio, na última noite do Ano Velho.
A luz do Ano Novo iluminou o pequenino corpo, ainda sentado no canto, com a mão cheia de fósforos queimados.
- Sem dúvida ela quis aquecer-se - diziam.
Mas... ninguém soube das lindas visões, que visões maravilhosas lhe povoaram os últimos momentos, nem em que halo tinha entrado com a avó nas glórias do Ano Novo.

Bubbly girl, bubble away to your bubbly world...


R.eminiscências

Percebesse eu de momentos auto-destrutivos, e este seria um daqueles de auto-análise em que se descreveria até à exaustão os porquês, as causas, os motivos da destruição. Depois viriam as interpretações, reminiscências vindas da infância: o excesso de mães, a deficiência de pai, o ser filha única numa família de 7 e ainda por cima, numa casa com poucos quartos. Uma família com poucos avós para demasiados netos, poucas garrafas de amor para tanta gente com sede. Fosse este um desses momentos de auto-análise e descreveria os aniversários com os meninos sem casa, meninos sem casa-de-banho que eu insistia em convidar sem autorização por querer desesperadamente ter uma infância normal onde podia ter uma festa de aniversário com crianças, e não com adultos, que de certa forma estavam fartos de crianças, "Já és uma mulherzinha". Talvez no tamanho das calças, talvez na altura, não tinha culpa por estar a crescer rápido.
Mas hoje não há auto-análises para fazer, hoje penso nos Açores.
Os Açores fazem-me lembrar a Marlene e o seu pai lenhador. A Marlene andou comigo na escola, éramos amigas, ela era do Sporting e gostava dos bailes em Agosto, o pai dela como gostava dele tinto (o vinho, claro) levava as filhas com ele a todos os bailes, era uma farra. De certa forma eu invejava a brejeirice da Marlene, ela tinha duas coisas que eu nunca tivera, um pai e liberdade. Os Açores fizeram-me lembrar a Marlene e o seu pai lenhador. A Marlene ajudava o pai aos fins-de-semana, no Norte todos ajudam os pais no que podem, e quando chegava à escola às Segundas as suas mãos cheiravam a lixívia pois tentara eliminar todos os resíduos de resina, para estar bonita. A Marlene cresceu, eu cresci. Ela dançou em todos os bailaricos e eu desapareci da sua vida. Hoje vive nos Açores, é professora primária, vive rodeada do mar e aposto que já não precisa de lavar as mãos para estar bonita antes de ir para a escola. A Marlene andou comigo na escola e hoje, hoje eu lembrei-me dela.

In - Toxic - Action
R.Posição


Encostado a uma esquina sombria chupava uma beata apagada que encontrara no bolso. Esperava por ela desde as sete. De vez enquando espreitava os ponteiros do relógio, e estes insistiam em dizer-lhe que ela se atrasara uma vez mais. Ia espreitando para a rua da esquerda, para ver se sentia o seu cheiro intenso a fruta silvestre, mas não sentia nada, e os nervos iam corroendo aquela alma empedernidade romântico incurável. Sentou-se novamente nos degraus da Rua Almirante Reis, acendeu de novo a beata. Pensava nela, nas coxas redondas, o seu decote profundo que mostrava sempre mais do que devia. Desejava-a. De uma das janelas abertas uma música espalhava-se pela noite, incendiando-o ainda mais, como se isso fosse humanamente possível, pensou. 'I want you, I want you so bad'

Magic Carpet, tell me, are we going?


Wondering... Egypt or no Egypt?