Meia de leita (com vinho)
Queria beber. Beber até não poder aguentar mais e cair inerte sobre a relva húmida, depois correr sem parar até que o sol começasse a nascer do lado de lá do lago. Extasiada com o espectáculo, podia jurar que se ali morresse para sempre, não se importaria.
Observação (black book)
A única coisa que eu queria era conduzir eléctricos. Seguir a mesma linha todos os dias, e nem precisava de ser daquelas muito compridas. Falaria sobre trivialidades com as velhinhas, podia ser sobre o tempo, e como está um belo dia de sol hoje! Usava a mesma farda todos os dias (ora, não a mesma, só igual!) e percorreria a minha linha ao volante do eléctrico, como um pirata ao leme da sua rua. Talvez dessa forma sentisse que a vida segue um rumo qualquer, e eu, capitão do meu barco, a guiar certeiramente a vida neste mar tortuoso que são os sentimentos.
Black book II
Tenho uma memória pequenina. Talvez o espaço dentro da minha cabeça seja tão grande que ela se perde sem se conseguir encontrar, jamais. Será uma maneira de conseguir assegurar a minha sanidade mental?
Quantas menos coisas me lembrar melhor vou conseguir viver.
Durante quanto tempo?
Quero essas memórias. Quero-as para as mergulhar no tinteiro da fantasia e as moldar como se fossem um pedaço de barro com o qual posso brincar indefinidamente. Visto este corpo todos os dias, é bonito. Mas não sei a que idade corresponde a minha cabeça, será uma idade antiga, tão antiga que todas as memórias do mundo são minhas, e assim sendo, aquelas que julgava serem únicas, estão misturadas com as memórias de toda a gente? Talvez por isso não as encontre quando as procuro. Vagueio como um pastor sem rebanho. Pastor louco que não podendo ser pastor por não possuir rebanho, quer na mesma sê-lo.
Quantas menos coisas me lembrar melhor vou conseguir viver.
Durante quanto tempo?
Quero essas memórias. Quero-as para as mergulhar no tinteiro da fantasia e as moldar como se fossem um pedaço de barro com o qual posso brincar indefinidamente. Visto este corpo todos os dias, é bonito. Mas não sei a que idade corresponde a minha cabeça, será uma idade antiga, tão antiga que todas as memórias do mundo são minhas, e assim sendo, aquelas que julgava serem únicas, estão misturadas com as memórias de toda a gente? Talvez por isso não as encontre quando as procuro. Vagueio como um pastor sem rebanho. Pastor louco que não podendo ser pastor por não possuir rebanho, quer na mesma sê-lo.
Black book
Na minha sopa de pensamentos voam pássaros coloridos que me falam de dias alegres. Os pontos de exclamação povoam o meu imaginário. A cada dia que passa, sinto que a loucura me apanhou mais um bocadinho.
I'll met you somewhere
Há uma falta de jeito genética para a demonstração de afectos, mas vou tentanto curar esta minha leprosidade de não saber sentir as coisas certas e de escolher os momentos errados. Pensei em ti, e fui novamente a Julieta à janela, sorridente e feliz, corada, não com aquela cor deslavado que augura maus presságios - e parece-me ser um bom sinal, estamos juntos ainda, algures num imaginário que existe nesta minha cabeça estranha de menina que inventa histórias, mas sempre assim fui, eu própria sou um "Era uma vez". Não ouviste, mas disse-te obrigada por tudo, e se algum dia perceberes estes amores silênciosos espero que leves contigo os mil aviões de papel que voam por esse céu fora à tua procura. Vamos ser para sempre um desencontro, uma estrada que nunca se acabou de escrever, mas és sem dúvida a história que eu mais gosto de lembrar. Era uma vez uma cor que nunca existiu, um ponto entre mim e ti...
Há lugares que se confundem e outros que se fundem
Tenho hábitos esquisitos. Sou obsessiva. Se há coisa de que tenho medo é de todas as coisas que posso fazer inexplicavelmente. Esses apetites estranhos que surgem na escuridão. Não sei nada de nada. É isso ser inocente? É ser ignorante? É ser livre de... ser livre do peso de saber das coisas? Diz alguma coisa, diz qualquer coisa. O silêncio deixa-me perdida. Em breve temos de acordar novamente e é mais um dia. E eu quero mostrar-te tudo, coisas, alguma coisa.
o que eu sei, o que eu não sei - as coisas que digo e aquelas que não
Para que servem as palavras se não sabemos o que fazer com elas? Para quê falar, escrever? Não dizemos nada. O Silêncio é o grande senhor da verdade. É coerente, sincero, pensa sempre naquilo que sente. Não se precipita numa diarreia sem sentido, não cai em armadilhas ardilosas de terceiros. Eu gosto do meu silêncio, conversamos muitas vezes sobre coisas triviais (quem sabe sobre formigas que caem dentro de frascos de compota) e discutimos também as grandes questões da vida, o sentido das coisas. Pudesse eu guardar nalgum lugar esses devaneios nocturnos ou matinais e seria rica - um conhecimento de mim própria sem fim - mas essas conversas têm tendência de se evaporar com o barulho da vida e eu fico sem saber nada e, geralmente, caio no erro de abrir a boca e falar de mais.
Quem a irá amar agora? (Inspired by a woman in Restelo)
E naquele indefinido dia de Inverno, naquela hora em que a tarde se funde com a noite, uma rapariga alada percorria mais uma rua em busca de clientes. De ar catita e vazio, daquelas que os homens mais gostam. Pensava nos brinquedos da infância para entreter a mente e retardar as perguntas vorazes vindas de dentro de si mesma, daquela que vive dentro do seu corpo e a vê vender-se assim, a qualquer um, sem amor nem prazer. Pensava como gostava de brincar quando era ainda uma menina, como tinha uma imaginação fértil, como sonhava. O mundo era tão mais inocente, e aquele lusco-fusco nunca lhe metera confusão. Restavam-lhe agora as parcas memórias para se afogar nelas enquanto se aquecia no corpo de estranhos. Um carro pára e a janela abre-se devagar. Ela não tem pressa. Pudesse a vida inteira resumir-se àquele momento, antes de tudo acontecer. As luzes da rua acendem - está na hora de começar a trabalhar.
Beloved Fernando (Pessoa)
"De quem é o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo
Enquanto estou pensando?"
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo
Enquanto estou pensando?"
Revisited - Entrelinhas (algures estou eu, caneta de aparo sem tinta)
Sentou-se no bar. As mãos tapando o rosto. A agonia de mais um dia naquelas mãos. O barman olha-a. Limpa um copo com paciência, pergunta-lhe o que vai ser e ela atira-lhe "cheio". Whisky. Ela não gosta de whisky, fá-la sentir agoniada. Bebe. Precisa sentir algo forte. Resumindo, precisa sentir qualquer coisa para além das suas duas mãos frias. O copo fica vazio. Pede outro. Não sabe porque está a beber. Acha que é por estar triste. Ela não se sente triste, na realidade seria bem mais fácil se ao menos pudesse saber com exactidão que raio de tumulto é aquele que atravessa. Olha à volta. Um par de velhos olha intrepidamente um jogo de futebol, trocam comentários sem nunca desviarem o olhar. De vez enquando o barman para de esfregar os copos com o seu farrapo para ficar a admirar o ecran florescente. Abana com a cabeça quando discorda com alguma coisa. "Mais um?" pergunta-lhe o homem ao ver o copo novamente vazio. Só a conta. Quer sair dali, precisa caminhar durante um bocado, caminhar destila-lhe o furor de mais um dia vazio de nadas absurdos e sem sentido. Sai do café, a pergunta que lhe aparece na cabeça irrita-a "esquerda ou direita?", está-se a foder se é para a esquerda ou direita. Acaba por ir para a direita, a rua é a descer e vai em direcção ao mar. Ao rio, já não se lembra do que é aquilo, que cidade é, qual o nome. Lembra-se vagamente de ter ouvido falar de outros lugares no mundo. Hoje? Hoje é só um dia para não ser, e na realidade, ela não acredita mais nisso.
Respondendo ao Quiz proposto por "Bandida Estilosa Que Chega Roubando A Cena"
11 Perguntas para serem respondidas
(Aqui estão as tuas respostas Nathy)
1- tem algo que fez no passado e hoje se arrepende?
Não tenho coisas que me arrependa de ter feito, tenho sim coisas que me arrependo de NÃO ter feito. Todas as coisas que queria ter feito e não fiz por medo. Todas as saídas à noite que não fiz, os beijos que não roubei, os amores que não declarei, os abraços que não dei...
2- ja sofreu algum tipo de preconceito?
Não.
3- o que na sua vida não poderia faltar nunca?
Amigos. Paixão. Uma caneta para escrever. Café.
4- tem alguém que ja morreu que se pudesse traria de volta? quem?
A minha mummy.
5- gosta de animais? tem algum?
Adoro animais! E tenho 3 gatos (Napoleão, Amália e Chamussa)!
6- tem algo que detesta em uma pessoa?
Eu tento sempre ver o lado positivo das pessoas, todos temos coisas detestáveis e lados adoráveis!
7- o que mais te machuca em uma relação?
Quando o amor começa a morrer e sabes que não o podes salvar.
8- sente muito ciumes de algo ou alguem? o que ou quem?
Só se gostasse de duas pessoas ao mesmo tempo, e essas pessoas gostassem uma da outra... aí sim, acho que ficava muito ciumenta.
9- acha que existe vida após a morte?
Não. Acho que depois da morte somos apenas matéria.
10- acredita no fim do mundo?
Tudo tem um fim... Acho que sim.
11- se pudesse falar hoje algo pra uma pessoa que está brigada ou que as vezes não tem coragem de fala por timidez falaria o que pra ela agora?
Desculpa. Tenho saudades tuas. Queres ir dar um passeio um dia destes?
(Aqui estão as tuas respostas Nathy)
1- tem algo que fez no passado e hoje se arrepende?
Não tenho coisas que me arrependa de ter feito, tenho sim coisas que me arrependo de NÃO ter feito. Todas as coisas que queria ter feito e não fiz por medo. Todas as saídas à noite que não fiz, os beijos que não roubei, os amores que não declarei, os abraços que não dei...
Não.
Amigos. Paixão. Uma caneta para escrever. Café.
A minha mummy.
Adoro animais! E tenho 3 gatos (Napoleão, Amália e Chamussa)!
6- tem algo que detesta em uma pessoa?
Eu tento sempre ver o lado positivo das pessoas, todos temos coisas detestáveis e lados adoráveis!
Quando o amor começa a morrer e sabes que não o podes salvar.
Só se gostasse de duas pessoas ao mesmo tempo, e essas pessoas gostassem uma da outra... aí sim, acho que ficava muito ciumenta.
Não. Acho que depois da morte somos apenas matéria.
Tudo tem um fim... Acho que sim.
Desculpa. Tenho saudades tuas. Queres ir dar um passeio um dia destes?
Estou?
"Confunde-se o que existe
Com o que durmo e sou.
Não sinto, não sou triste,
Mas triste é o que estou." (fp)
Com o que durmo e sou.
Não sinto, não sou triste,
Mas triste é o que estou." (fp)
Writer's Block (parte 123... ou seja ela qual for)
Toda eu sou uma tempestade de pensamentos que não param de revolver o fundo da alma. Entretenho-me com o mundo, como uma criança inquieta, mas não é a cabeça que está confusa. O que fazer quando tudo o que tenho são coisas que não se podem dizer? Cores secretas que fazem a cidade ficar mais triste. Pudesse eu viajar de comboio e fugir, de mim mesma, das coisas que levo por dentro da cabeça e por fora dos sentimentos. Houvesse algures uma caneta que escrevesse de facto a verdade, mas todas elas mentem.
Crime (visitando 2009)
Eu quero cometer um crime. Quero correr riscos e sentir a adrenalina, o suspense. Eu quero ser o teu crime.
Sinal de Alarme
crime #363 das 10h01 na última carruagem da linha azul.
"A paixão é piegas, o Amor vai á luta." Vera Saldanha. 13 de fevereiro, 2012
"A paixão é piegas, o Amor vai á luta." Vera Saldanha. 13 de fevereiro, 2012
Ninguém ouve, but listen to the girl
Às vezes gosto de me perder a ler as coisas que escrevo. São como um fio de Ariadne para os cantos escuros que já não consigo encontrar. Quero encontrar? Já fui muitas pessoas, e de repente sinto que todas são partes de um mesmo corpo desconjuntado que se quer montar como um puzzle mas que não consegue, está estragado, faltam peças. Talvez algumas estejam contigo, eu não acredito, mas quem sabe. Já foste palavra nos meus textos. Foste saudade, amor, morte, sexo e vontade, e quem sabe é mesmo isso que me falta.
A verdade é que a maior parte das vezes tenho preguiça de escrever, as minhas mãos são demasiado lentas para a minha cabeça, perco as ideias por não as conseguir escrever ao ritmo a que elas nascem no ninho da imaginação. Cliché? É triste, mas é mesmo assim. Vamos conversar em slow motion, quero ver como te mexes, não estás morto pois não? Quero fazer parte de uma banda, cantar para ti, mesmo quando não estás a ouvir. Mas a terra já rodou demasiadas vezes e não sei onde páras. Qual é a tua janela? Já não sei onde moras nem sei a cor do teu pijama. Raios, há mil coisas que eu quero fazer, quero sentir a vida, a vida a maior parte das vezes não se sente, mas quando se sente, vale mesmo a pena.
A verdade é que a maior parte das vezes tenho preguiça de escrever, as minhas mãos são demasiado lentas para a minha cabeça, perco as ideias por não as conseguir escrever ao ritmo a que elas nascem no ninho da imaginação. Cliché? É triste, mas é mesmo assim. Vamos conversar em slow motion, quero ver como te mexes, não estás morto pois não? Quero fazer parte de uma banda, cantar para ti, mesmo quando não estás a ouvir. Mas a terra já rodou demasiadas vezes e não sei onde páras. Qual é a tua janela? Já não sei onde moras nem sei a cor do teu pijama. Raios, há mil coisas que eu quero fazer, quero sentir a vida, a vida a maior parte das vezes não se sente, mas quando se sente, vale mesmo a pena.
O azul do céu faz pena a quem não pode ter na alma uma azul do céu também
Um desejo, não de ser ave,
Mas de poder
Ter não sei quê de voo suave
Dentro em meu ser.
(Fernando Pessoa)
Mas de poder
Ter não sei quê de voo suave
Dentro em meu ser.
(Fernando Pessoa)
Contos do arco da velha, dos dias de frio em que os pés se tocavam na vez das mãos. Mas não interessa... já nada interessa, está tudo morto.
Há um fantasma que espreita pela janela para saber as horas. Na minha embriaguez, partilho com aquele fantasma o meu conhecimento das coisas simples da vida. Olha para mim fantasma, como é linda a noite, prolonga-se para lá do horizonte até ao sol nascer. Arrasto os dedos para escrever, bebo, bebo e assim acredito que a vida é bela. Acredito que o amor e o sexo se descomplicam. Há coisas que te quero mostrar, eu quero mostrar-te coisas que não conheces. Só penso nelas quando estou bêbeda, se assim não fosse não saberia da sua existência. Passo à frente da tua janela e fico à espera que espreites, como o fantasma, mas nunca o fazes. Espreita meu amor... espreita.
O caderno vermelho II
Pudesse eu perceber alguma coisa do que se passa dentro da minha cabeça e escreveria um livro sobre como vestir uma mulher com pele de cobra. Mas não percebo nada e tudo são palavras diferentes, de pessoas diferentes, como se uma bomba tivesse explodido e houvesse a necessidade de reconstruir um corpo mas não se sabe bem qual - nem bem como. Vivo com os pés na cabeça por cérebro e a cabeça nas mãos. Não dá para ter conversas ou pegar em coisas, sou um vice versa sem sentido.
E a lua continua a crescer ou decrescer lá fora, como se nada fosse, sem pensar nesta carnificina que vai dentro dos meus eus que vão existindo dentro e fora de mim, pois quando dou por mim já não dou por quem sou.
E a lua continua a crescer ou decrescer lá fora, como se nada fosse, sem pensar nesta carnificina que vai dentro dos meus eus que vão existindo dentro e fora de mim, pois quando dou por mim já não dou por quem sou.
O caderno vermelho
O meu pai era um homem alto e forte que chegava sempre a casa tarde. Eu ficava muito contente quando o via, com ele chegava o silêncio com que todas as coisas se vestiam, um nocturno diferente. Nunca conversámos, eu e o meu pai, talvez sobre trivialidades, frases curtas, para que eu agora não pudesse escrever que conversava com o meu pai.
Eu achava que tinha o melhor pai do mundo, mas estava enganada, há pais melhores, o meu era mais ou menos. Eu às vezes queria estar muito zangada com ele, mas não consigo, primeiro porque ele é meu pai, segundo porque sei que ele não é lá muito feliz. O meu pai é uma pessoa solitária e não consegue mostrar o que sente. Tenho pena por ele, porque o amo e ele não sabe isso. Queria que ele soubesse.
Obrigada pai pelos pés que me deste e por me pores na rua, o mundo é um lugar grande e há espaço para todos. Somos muitos e felizes.
Missão para hoje: photography!
(vertigem)
s. f.
1. Sensação ilusória de movimento do corpo ou movimento à volta do corpo. = DELÍQUIO, TONTURA, VÁGADO
2. [Figurado] Tentação súbita; acto descontrolado ou irreflectido , súbito e irresistível pela sua própria força e instantaneidade.
3. Capricho, fantasia, desejo irresistível.
Tudo dorme e é feliz, menos eu.
"Sou os arredores de uma vila que não há, o comentário prolixo a um livro que se não escreveu. Não sou ninguém, ninguém. Não sei sentir, não sei pensar, não sei querer. Sou uma figura de romance por escrever, passando aérea, e desfeita sem ter sido, entre os sonhos de quem me não soube completar.
Poder saber sentir!" (O Livro do Desassossego)
Poder saber sentir!" (O Livro do Desassossego)
Revisited (exercícios)
Carlota era uma rapariga enfezada e sem piada. Os cabelos pretos, pingões, que lhe pousavam nos braços como um manto de velha,escondiam-na como um cortinado esconde os trastes de família. Os olhos, herdados do lado do pai, eram grandes e cinzentos. Descaídos, no entanto, conferindo à pobre rapariga uma ar tristeza que lhe tingiu a alma com o tempo. A boca era pálida como a de um morto, lábios finos, inertes, lábios que não sabiam certamente sorrir. Carlota era uma rapariga triste filha de pais professores. Não tinha muitos amigos, mas isso não lhe fazia falta pois ela nem sabia o que era isso de ter amigos. No Verão, quando os primos da cidade visitavam os avós, Carlota convivia com eles a contra gosto, não sabia brincar com outras crianças e acabava sempre por criar inimizades com a prima Ana, prima que odiava em segredo por ser a favorita da avó. Os Invernos passava-os no seu quarto a brincar com as bonecas que a avó lhe trazia de Espanha, eram todas de um plástico barato e tinham mãos grandes com dedos abertos que arranhavam, a única coisa que faziam era abrir os olhos e fechar. Ainda assim ela mantinha-as bem arrumadas por tamanho e cor de cabelo, não lhe agradava a desarrumação, tudo tinha de ser ordenado. Diziam os pais, quando os primos lá passavam, que Carlota seria no futuro uma excelente bibliotecária, quem sabe trabalhasse num importante arquivo algures a catalogar processos. Carlota suspirava, sabia lá o que os pais queriam dizer com aquilo, ela somente desejava viver na aldeia para sempre, a confusão de gente deixavam-na triste e só.
Carlota era uma criança diferente. Vivia naquela solidão de ser a única com bonecas de plástico.
Pausa para lanchar . Pausa para respirar . Pausa para redefinir a brancura (clarão indeciso que precede a aurora)
Eu faria um filme a preto e branco... e depois, se eu pudesse, comprava um projector para ficar a noite inteira a ver as folhas abanar com o vento.
Não o amor, mas os arredores é que vale a pena.
Uma inquietação enorme fazia-me estremecer os gestos mínimos. Tive receio de endoidecer, não de loucura, mas de ali mesmo. O meu corpo era um grito latente. O meu coração batia como se falasse.
A solidão desola-me; a companhia oprime-me. A presença de outra pessoa desencaminha-me os pensamentos; sonho a sua presença com uma distracção especial, que toda a minha atenção analítica não consegue definir.
"Quero-te só para sonho", dizem à mulher amada, em versos que não lhe enviam, os que não ousam dizer-lhe nada.
(Bernardo Soares)
E enquanto não escrevo nada, vou tomando nota das coisas que escrevo.
E enquanto não escrevo nada, vou tomando nota das coisas que escrevo.
Em vão, em vão, e o céu
Mas eu, o mal-dormido,
Não sinto noite ou frio,
Nem sinto vir o dia
Da solidão vazia.
Só sinto o indefinido
Do coração vazio.
(Fernando Pessoa)
Não sinto noite ou frio,
Nem sinto vir o dia
Da solidão vazia.
Só sinto o indefinido
Do coração vazio.
(Fernando Pessoa)
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